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10.2. Um programa de desprivatizações para a legislatura

10.2.1. ANA

A ANA constitui um dos ativos estratégicos mais valiosos do país, sendo a entidade responsável por todas as infraestruturas aeroportuárias nacionais. Até 2012 foi uma empresa pública lucrativa que constituía um monopólio natural em regime de exclusividade conferido por lei. No final desse ano, foi comprada pelo grupo francês Vinci a troco de 3080 M€, dos quais 1200 M€ correspondem à concessão dos aeroportos por cinquenta anos e 700 M€ corresponderam a dívida assumida. O valor da compra da ANA foi assim de 1880 milhões, dos quais 700 M€ de passivo e 1180 M€ de ativos, incluindo os dez principais aeroportos do continente e regiões autónomas. Nestes termos, esta venda deve ser classificada como uma operação de delapidação do património público e do Tesouro Nacional, tomada pelo último governo PSD/CDS.

Em apenas oito anos (2013-2020), o valor dos dividendos pagos equivale a 40,2% do valor da aquisição da ANA. Assim, a manter-se o mesmo nível de recuperação do investimento, no final desta década esse valor estará totalmente recuperado. Depois disso, a Vinci apenas terá de pagar uma renda anual de 24 milhões de euros por dez aeroportos, transformando o negócio da ANA no mais lucrativo de todos os negócios do grupo francês.

O erro do aeroporto do Montijo

A direita promoveu o contrato ruinoso da privatização da ANA. Frente à necessidade de construção de um novo aeroporto, o governo do PS apoia a solução da Vinci – aeroporto no Montijo -, a solução mais barata e que não envolve qualquer investimento dos acionistas, pois está desenhada para ser paga apenas com as receitas aeroportuárias do aeroporto de Lisboa. A suposta “solução” tem graves impactos ambientais na fauna e na flora da zona de reserva internacional do Tejo e identificam-se impactes negativos ao nível do ruído em zonas densamente povoadas no Arco Ribeirinho Sul, especialmente as que se situam por baixo do corredor aéreo de aproximação.

A solução Montijo carece de estudo de impacte ambiental, e no final de 2020 o Governo optou por deixar caducar a Declaração de Impacte Ambiental de Alcochete, única opção verdadeiramente estudada no século XXI.  O governo continua a ceder aos interesses da Vinci, como ficou patente no Memorando financeiro assinado no início de 2019 e como ficou patente na insistência numa opção claramente má para o futuro do setor aeroportuário, do ambiente e das populações. 

O Governo lançou já em outubro de 2021 um concurso público internacional para a realização da avaliação ambiental estratégica da futura solução aeroportuária de Lisboa, com previsão de entrega em 2023. É o momento de olhar novamente para a opção Alcochete, cujos dados já nos indicam que seria a opção mais viável, caso venha a ser necessário no contexto de uma política adequada de transportes e transição climática.

O outro risco com a opção de Montijo seria o acesso apenas rodoviário. Como serão feitos quase em exclusivo pela ponte Vasco da Gama, (gerida em regime de PPP pela Lusoponte, cujo acionista principal é a Vinci), o governo oferece assim de mão beijada mais uma vantagem à multinacional francesa, não cuidando sequer de garantir uma acessibilidade ferroviária ao aeroporto, facto único na Europa.

A questão de um novo aeroporto de Lisboa cuja necessidade está inscrita no próprio contrato de concessão da ANA à Vinci configura-se como uma das razões substantivas para corrigir o grave erro estratégico de privatizar a ANA. A nacionalização da ANA é não apenas condição para resolver a questão de um novo aeroporto, como também para responder às insuficiências que diversos aeroportos já apresentam.   

10.2.2. CTT

Os CTT foram, até 2012, uma empresa pública prestadora do serviço público universal de comunicações em todo o território nacional, com apreciáveis níveis de qualidade e de rentabilidade. Entre, 2005 e 2012, os Correios realizaram mais de 500 milhões de euros de lucro para o Estado, integrando o ranking dos 5 melhores serviços postais da Europa.

Em 2013-14, o governo do PSD/CDS vendeu a empresa a privados por 920 milhões de euros e a partir daí começaram os problemas para o país. Portugal tornou-se o quarto país da União Europeia em que o serviço postal universal é totalmente privado, depois da Holanda, Malta e Reino Unido.

Em cinco anos, o serviço postal piorou radicalmente. Até novembro de 2018, encerraram 69 estações de Correio e, segundo a ANACOM (10/01/2019), “subiu para 33 os concelhos em Portugal que já não têm estações de correios”. Em novembro de 2021 reabrirá a última das estações de correios encerradas em 2018, mas continua a haver um défice de postos de correio, que tantas vezes funcionam a expensas do Estado. 

Com a privatização, o total de reclamações aumentou 122%, originadas por atrasos, extravios, falhas de distribuição e mau atendimento. Tudo violações grosseiras do Contrato de Concessão que já foi prorrogado por ajuste direto, sem existirem garantias de melhoramento do serviço prestado. 

Em paralelo foi-se erguendo um novo banco comercial privado, que funciona em instalações dos correios, com trabalhadores dos correios, com custos de funcionamento pagos pelos CTT, num inaudito processo de vampirização empresarial que governo, Banco de Portugal, Autoridade da Concorrência e ACT toleram.

Entretanto o processo de descapitalização e de assalto aos CTT pelos privados continua. Para garantir a remuneração dos acionistas privados, o anterior  presidente da administração entregou dividendos acima dos resultados líquidos anuais, num total de 338 milhões de euros, conseguidos à custa da venda do património e da descapitalização da empresa. Como recompensa pelos serviços prestados, o anterior presidente da administração, Francisco Lacerda, tinha, em 2017, uma remuneração anual superior a 900 mil euros em salários, mas anunciava ao mesmo tempo a redução de mil efetivos em nome da “sustentabilidade futura da empresa”. Já o seguinte presidente da administração dos CTT, João Bento, não tem tido uma melhor atuação, tendo decidido distribuir dividendos em plena crise pandémica. Foi só depois da pressão das ORT e com o apoio do Bloco de Esquerda que a decisão foi revertida. Além do mais, as pressões sobre os trabalhadores dos CTT continuam, sem aumentos salariais e recurso a trabalho precário, ao mesmo tempo que se continuam a incumprir índices de qualidade. 

A solução da direita é manter tudo como está. Nos programas eleitorais de 2009 e 2011, bem como no Memorando que assinou com a Troika o PS propunha a privatização dos CTT. Em consequência, tem rejeitado várias iniciativas legislativas do Bloco que visaram travar o desmantelamento e a descapitalização dos CTT e recuperar a empresa pelo controlo público. O governo tardou, inexplicavelmente, em tomar decisões sobre a renegociação da concessão do serviço público universal aos CTT a partir de 2021. Por isso, optou por prorrogar o contrato por mais um ano, em regime de ajuste direto, tendo retirado competências da ANACOM no que toca aos indicadores de qualidade do serviço postal universal. Um favor à administração privada dos CTT, que desde 2016, pelo menos, tem falhado praticamente todos estes indicadores. 

A proposta do Bloco:

  • Nacionalização das ações representativas do capital social dos CTT e a realização de uma auditoria independente que quantifique todas as ações lesivas do serviço e do erário público tomadas pela gestão privada dos CTT, bem como as tomadas pelo XII Governo constitucional (PSD/CDS).

10.2.3. REN

A Redes Energéticas Nacionais, S.A. (REN) é a empresa responsável pela gestão global do Sistema Elétrico Nacional e do Sistema Nacional de Gás Natural e pela gestão das respetivas Redes Nacionais de Transporte. Hoje é uma sociedade anónima de capitais inteiramente privados, cujos principais acionistas são a multinacional chinesa State Grid of China (25%), a Pontegadea (12%) e Lazard Asset Management (7%). O valor da capitalização bolsista ronda atualmente 1670 milhões.   

A relevância estratégica desta empresa define-se pelo facto de deter a exclusividade do transporte em alta das redes de energias no país. A resposta aos desafios da penetração da renovável descentralizada, do planeamento de rede e da segurança de abastecimento estão hoje em mãos da REN, controlada pelo Estado chinês, que assim detém o monopólio do transporte de eletricidade e gás natural. É um erro político e um atentado contra a soberania e segurança energética deixar este monopólio nacional nas mãos de multinacionais, Estados estrangeiros, fundos de investimento e de capital de risco. É desejável que tal risco desapareça e por isso é do interesse estratégico do país assumir o controlo pleno da operação da REN.

A proposta do Bloco:

  • A desprivatização da REN deve iniciar-se pela recuperação dos ativos de planeamento e gestão global do sistema elétrico e de gás natural, os quais devem ser reunidos num operador de sistema independente sob a forma de empresa pública, tal como a legislação europeia admite. O valor deste conjunto de ativos a nacionalizar de imediato rondará os 50 milhões de euros.

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