A entrada na União Económica e Monetária alterou por completo as regras e os instrumentos das políticas económicas nacionais. Com o desaparecimento das políticas monetária e cambial, os desequilíbrios entre Estados-membros dispararam com excedentes correntes crescentes nas economias do centro e défices também crescentes na periferia. O endividamento externo de Portugal, medido pela sua Posição de Investimento Internacional Líquida (PIIL) começou a aumentar ainda durante o processo de convergência nominal e não parou de crescer até 2014. Entre 1996 e 2014, a PIIL em percentagem do PIB aumentou de 13% para 119% do PIB, nove vezes mais.
A crise financeira provocou a nacionalização de uma parte desta dívida. A dívida pública portuguesa, que estava controlada em 50% do PIB antes da entrada no Euro e começou a crescer paulatinamente devido à estagnação económica dos anos que se seguiram, disparou para 130% graças à recessão provocada pela crise financeira e, subsequentemente, pelo programa de ajustamento da troika. A redução dos últimos anos ficou a dever-se à criação de emprego resultante da reversão de uma parte das políticas da troika. A expressão “Crise das dívidas soberanas” ou “dívidas públicas” é por isso um equívoco.
A resposta da direita é simples e foi cristalizada na formulação de Passos Coelho: “Só saímos da crise empobrecendo.” A resposta ao endividamento externo seria a compressão dos salários imposta através da desregulação das relações de trabalho. A resposta ao endividamento público seria a compressão da despesa com os serviços públicos e o investimento. O problema destas respostas é que amarram o país a um percurso de subdesenvolvimento e divergência. A estagnação económica agrava os problemas de endividamento público. O colapso do investimento agrava a dependência externa.
A alternativa da esquerda parte do problema do fundo da nossa inserção na União Económica e Monetária. A única estratégia sustentável é uma política que investe nos setores determinantes para a nossa dependência externa, retendo os as trabalhadoras e trabalhadores qualificados que estão a abandonar o país. A transição energética, os transportes coletivos, a reabilitação urbana e eficiência energética, a política para a agricultura e distribuição juntam-se à libertação do Estado Social dos setores rentistas para responder ao problema da dívida na sua raiz: o atraso económico e o ciclo da dependência.
Na resposta à pandemia, a União Europeia chegou com atraso aos apoios necessários para defesa da economia e do emprego e com valores muito mais baixos quando comparados com os pacotes financeiros de outros blocos económicos. As regras de défice e da dívida, coletes de forças que os Tratados impõem aos países, regressarão rapidamente a vigorar, atrasando a retoma económica que se deseja. E foi com o receio desta ameaça que o Governo de António Costa, sempre procurando ser um bom aluno europeu, colocou Portugal como um dos países com menor investimento público para enfrentar os efeitos nefastos da pandemia. É preciso libertar o investimento público destas amarras que nos atrasam.
Mantemos o projeto de uma Europa de democracia, liberdade e solidariedade. É esse compromisso que impõe a insubmissão à União Europeia dos tratados e das regras do euro.
As propostas do Bloco:
Autonomia total do país na tomada de decisões sobre o sistema financeiro, incluindo processos de nacionalização, recapitalização, resgate, resolução ou venda;
Eliminação das regras do mercado interno que condicionam a possibilidade de decisões soberanas sobre política industrial dos Estados-membros, nomeadamente no que diz respeito a políticas de compras públicas, motivadas pelo desenvolvimento de setores estratégicos ou implementação de circuitos curtos;
Definição de um limiar mínimo para a tributação dos rendimentos de capital em todos os Estados-membros e territórios da União Europeia;
Exclusão da comparticipação nacional associada aos fundos comunitários do cálculo do défice, bem como do investimento público associado a serviços públicos essenciais e cumprimento das metas ambientais;
Desvinculação do país do Tratado Orçamental, na sequência do chumbo recente da sua transposição para direito comunitário;
Inversão das prioridades da política monetária, na medida em que se mantenha o atual quadro institucional, colocando a promoção do pleno emprego como objetivo primário do Banco Central Europeu;
Reforço da política de coesão, seja através de recursos próprios assentes na tributação de rendimentos de capital, seja através do aumento das contribuições, e da sua capacidade redistributiva;
Definição de padrões de proteção laboral, social e ambiental em todo o espaço europeu, que trave a corrida para o fundo nos direitos e na sustentabilidade, e imposição desses padrões em quaisquer acordos comerciais com países ou regiões terceiras.
R. da Palma, 268
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